A seleção natural, nos tempos ancestrais, quando vivíamos em bandos pequenos e estáveis como o dos babuínos, programou impulsos altruístas em nosso cérebro, junto com impulsos sexuais, impulsos de fome, impulsos xenofóbicos, e assim por diante. Um casal inteligente pode ler Darwin e ficar sabendo que o motivo último de seus impulsos sexuais é a procriação. Eles sabem que a mulher não ficará grávida porque está tomando pílula. Mesmo assim seu interesse sexual não fica diminuído por conta desse conhecimento. Desejo sexual é desejo sexual, e sua força, na psicologia individual, independe da pressão darwiniana que o provocou. É um forte impulso que existe de forma independente de sua explicação racional.
Estou sugerindo que a mesma coisa aconteça com a bondade — com o altruísmo, a generosidade, a empatia, a compaixão. Nos tempos ancestrais, só tínhamos a oportunidade de ser altruístas em relação aos parentes próximos e a potenciais replicadores. Hoje essa restrição não existe mais, mas a regra geral persiste. Por que não persistiria? É a mesma coisa que o desejo sexual. Não podemos fazer nada para deixar de sentir pena quando vemos um desafortunado chorando (mesmo que não seja nosso parente nem seja capaz de retribuir), assim como não podemos fazer nada para deixar de sentir desejo por um integrante do sexo oposto (que pode ser estéril ou incapaz de reproduzir). As duas situações são “erros”, equívocos darwinianos: equívocos abençoados e maravilhosos.
Não encare nem por um segundo essa darwinização como desmerecedora das nobres emoções da compaixão e da generosidade. Nem do desejo sexual. O desejo sexual, quando canalizado pelos conduítes da cultura linguística, ressurge na forma de grandes obras de poesia e de dramaturgia: os poemas de amor de John Donne, por exemplo, ou Romeu e Julieta. E é claro que a mesma coisa acontece com o redirecionamento equivocado da compaixão baseada no parentesco e na retribuição. A piedade em relação a um devedor, quando vista fora de contexto, é tão antidarwiniana quanto adotar o filho de outra pessoa.
*Richard Dawkins
Estou sugerindo que a mesma coisa aconteça com a bondade — com o altruísmo, a generosidade, a empatia, a compaixão. Nos tempos ancestrais, só tínhamos a oportunidade de ser altruístas em relação aos parentes próximos e a potenciais replicadores. Hoje essa restrição não existe mais, mas a regra geral persiste. Por que não persistiria? É a mesma coisa que o desejo sexual. Não podemos fazer nada para deixar de sentir pena quando vemos um desafortunado chorando (mesmo que não seja nosso parente nem seja capaz de retribuir), assim como não podemos fazer nada para deixar de sentir desejo por um integrante do sexo oposto (que pode ser estéril ou incapaz de reproduzir). As duas situações são “erros”, equívocos darwinianos: equívocos abençoados e maravilhosos.
Não encare nem por um segundo essa darwinização como desmerecedora das nobres emoções da compaixão e da generosidade. Nem do desejo sexual. O desejo sexual, quando canalizado pelos conduítes da cultura linguística, ressurge na forma de grandes obras de poesia e de dramaturgia: os poemas de amor de John Donne, por exemplo, ou Romeu e Julieta. E é claro que a mesma coisa acontece com o redirecionamento equivocado da compaixão baseada no parentesco e na retribuição. A piedade em relação a um devedor, quando vista fora de contexto, é tão antidarwiniana quanto adotar o filho de outra pessoa.
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