sábado, 13 de dezembro de 2008

Guia de pensadores anarquistas - 1º parte


WILLIAM GODWIN

(1756-1835)


          Escritor e filósofo inglês, considerado o percursor do pensamento anarquista moderno, nasceu em 3 de março de 1756 em Wisbeach de uma família de dissidentes calvinistas.
          Seguindo a tradição da família, estudou teologia e foi nomeado pregador em 1778, chegando a ser pastor em diversas comunidades dissidentes até 1883. Influenciado pelas idéias da Revolução Francesa, sobretudo de Rousseau e Helvétius, afastou-se da religião, iniciando então sua reflexão sobre a realidade social.
          Nessa época ligou-se a um famoso grupo de intelectuais e trabalhadores revolucionários que se reuniam nas tabernas de Londres, tornando-se amigo de Thomas Paine, autor de 
Os Direitos do Homem. Em 1791 conheceu, nesse círculo, a que seria sua companheira Mary Wollstonecraft, percursora do feminismo, que em 1792 publicou a Reivindicação dos Direitos da Mulher. Dessa relação nasceu Mary Wollstonecraft Godwin futura companheira do poeta Shelley e autora da novela Frankstein.
          A partir de 1871 começou a elaborar seu livro 
Investigação Acerca da Justiça Política, editado em 1873. O livro causou escândalo e polêmica na sociedade inglesa pelas suas idéias filosóficas e políticas revolucionárias, tornando Godwin famoso.
          Nos anos seguintes escreveria várias obras literárias, das quais a mais famosa é Caleb Williams (1794), onde volta a expor suas idéias na forma literária. Godwin é o primeiro pensador a considerar que todo o estado e todo o governo é um mal, e que a sociedade poderia existir sem eles, sendo considerado um percursor do anarquismo moderno.
          Aquele que foi um autor famoso, morreu anonimamente em março de 1836, quando começava a se desenvolver o movimento socialista que iria aprofundar as idéias inovadoras que tinha analisado na sua obra.


PROUDHON, Pierre–Joseph

(1809-1865)


          Aquele que Bakunin considerava o mestre de todos os anarquistas, nasceu em França em 1809, numa família do povo.
          Operário, tipógrafo, autodidata, desenvolveu suas próprias teorias sobre organização social, baseada na cooperação e mutualismo. Em 1840 publicou o livro 
O Que é a Propriedade?, onde se declara pela primeira vez anarquista. O livro foi elogiado por Marx, que o tentaria atrair mais tarde (1846) para um grupo de pensadores socialistas. No entanto, Proudhon na resposta a Marx questiona a criação de novos dogmas, o que levaria à ruptura com o socialista alemão.
          Nessa época, 1844-1845, teve encontros em Paris com Bakunin e Marx. Mas logo em 1846 Marx escreveu o livro 
Miséria da Filosofia que é uma crítica violenta ao livro de Proudhon a Filosofia da Miséria.
          Em 1848 Proudhon foi eleito deputado à Assembléia Nacional por Paris. Em julho desse ano pronunciou uma discurso violento na Assembléia onde expõe a oposição entre proletários e burgueses, sendo objeto de advertência pelo Presidente do parlamento.
          No ano seguinte Proudhon tentou organizar o Banco do Povo, que não conseguiu prosperar. Seus artigos no jornal 
Representant du Peuple e Le Peuple valem-lhe vários processos judiciais que o obrigam a se exilar na Bélgica.
          De volta à França foi preso em 1849 tendo ficado na prisão até 1852, onde continuou escrevendo.
          A edição do livro 
De la Justice dans la Révolution et dans L'Eglise, esgotado em poucos dias, provocou novo escândalo e um novo processo judicial, que o obrigou a exilar-se, novamente, em Bruxelas.
          Regressou a França onde publicou novos livros entre os quais o 
Princípio Federativo e Da Capacidade Política das Classes Trabalhadoras que forneceu a base teórica do anarco-sindicalismo, defendendo que o "proletariado deve emancipar-se sozinho". Morreu em 1865, pouco depois da fundação da Primeira Internacional, criada em grande parte por iniciativa de operários mutualistas franceses.


BAKUNIN, Mikhail

(1814-1876)


          O mais brilhante dos teóricos e agitadores anarquistas, nasceu em Premukhino, Rússia em 11 de maio de 1814, originário de uma rica família da nobreza russa.
          Depois de ter seguido a carreira militar, abandonou o exército em 1832, quando começou a opor-se ao czarismo. Mas a sua ligação a idéias progressistas se deu a partir das suas leituras de Hegel, a amizade com o revolucionário russo Herzen e principalmente a partir da sua viagem ao Ocidente em 1840, quando freqüentou a Universidade de Berlim e o círculo dos hegelianos de esquerda em Berlim e Dresden na Alemanha, colaborando na revista crítica 
Anais Alemães de Arnold Ruge.
          Em 1843, aproximou-se do pensamento socialista a partir do contato com Moïse Hess e Proudhon, só vindo no entanto a se tornar um anarquista já nos anos 60, no seu exílio europeu. Durante os anos de 1848-1849 tomou parte ativa nas rebeliões que ocorreram em Paris, Praga e em Dresden ao lado de seu amigo Richard Wagner. Preso após a rebelião de Dresden, esteve em prisões da Saxônia e da Áustria, tendo sido entregue à polícia do Czar.
          Depois de doze anos nas prisões czaristas, em 1861 conseguiu escapar para o ocidente, tendo vivido na Inglaterra, Suíça e Itália onde conheceu Giuseppe Fanelli que com ele colaboraria na divulgação do anarquismo em Espanha.
          Por todo lado em que passou Bakunin participou da agitação social e da fundação de associações revolucionárias, tornando-se o mais conhecido revolucionário da sua época. A atração que Bakunin exercia sobre os círculos revolucionários esteve na origem de um dos episódios mais polêmicos da sua vida, as relações que manteve entre 1869 e 1872 com Netchaiev (1847-1882) um jovem revolucionário russo ligado ao grupo de Vera Zassoulitch, descrito como um jovem fanático, frio e cínico, que viria a ser o autor do 
Catecismo Revolucionário. Netchaiev, não só provocou inúmeros conflitos nos círculos dos exilados russos, como manteve uma atividade revolucionária inconseqüente que provocou repercussões negativas na Rússia. O comportamento de Netchaiev e suas teorias de que o fim justificam os meios, completamente afastados da tradição anarquista, foram repudiados expressamente por Bakunin a partir de 1870.
          A adesão de Bakunin à AIT, em 1868, foi decisiva na evolução das discussões entre as concepções de socialismo de estado e de socialismo libertário. Bakunin e Guillaume, foram os principais representantes da corrente anarquista que se opunha a Marx. Durante o Congresso de Haia, em 1872, foi oficialmente expulso juntamente com anarquistas de vários países da Internacional pelos marxistas. O comportamento de Netchaiev viria a ser usado pelo grupo marxista da AIT como um dos argumentos para expulsar Bakunin da Primeira Internacional.
          Nos últimos anos da sua vida, Bakunin não deixou de acompanhar os movimentos revolucionárias que ocorreram na Europa, entre os quais a tentativa revolucionária de 1874 em Bolonha na Itália.
          Seus principais livros são 
Deus e o Estado; Federalismo, Socialismo e Antiteologismo e Estatismo e Anarquia.
          Faleceu em 1 de julho de 1876, em Berna, na Suíça.


STIRNER, Max

(1806-1856)


          Pseudônimo do pensador alemão Kaspar Schmidt, nascido na Baviera, Alemanha, em 1806, filho de um artesão.
          De 1826 a 1828 estudou em Berlim, onde foi aluno de Hegel e Feuerbach, tendo voltada a essa universidade de 1832 a 1834. A partir de 1842 fez parte do círculo de intelectuais radicais Jovens Hegelianos que se reunia em torno de Arnold Ruge e Bruno Bauer, que tanto influenciaram Marx e Bakunin. Foi nas reuniões desse grupo que Engels o conheceu.
          Professor solitário, escreveu 
O Falso Princípio da Nossa Educação que seria publicado em 1842 por Marx na revista do grupo A Gazeta Renana.
          Seria no entanto 
O Único e sua Propriedade, publicado em 1884, que o iria tornar famoso, transformando-o no teórico do anarquismo individualista. Um dos alvos da crítica de Marx e Engels no livro A Ideologia Alemã seria Stirner, que rapidamente, no entanto, acabaria esquecido, vindo a ser redescoberto mais tarde por Henry Mackay.
          Sua vida, marcada pela pobreza e pela tragédia, certamente contribuíram para a elaboração de um pensamento que tem como centro o indivíduo solitário: o único que não deve sujeição a nada nem a ninguém. Seu livro valeu-lhe a celebridade e o escândalo: implodia com convenções, moral, mas também toda a doutrina social, política e filosófica de seu tempo. Ao afirmar: "livre não o sou em nenhum Estado" ou "todo o Estado é despótico". No entanto, sua idéia de um "eu" absoluto, mesmo quando ligada à sua concepção de um associativismo de egoístas, estava longe das idéias e valores que se expressaram no anarquismo social e mesmo no individualismo anarquista posterior. Stirner que se definia como Único, certamente o foi como pensador radical original, e nesse sentido é difícil classificá-lo, mesmo que por seu anti-estatismo e espírito herético era um libertário.
          O pensamento de Stirner no movimento anarquista teve uma influencia limitada, ganhando sua obra uma maior divulgação a partir de 1888, quando o poeta anarquista John Henry Mackay, escreveu sua biografia e algumas obras onde divulgava o anarquismo individualista. A partir de então suas teorias cativaram alguns círculos libertários alemães, norte-americanos e especialmente do individualismo francês, muito ativo no final do século XIX e começo do século atual.
          Morreu esquecido e na miséria aos 49 anos, a 25 de julho de 1856.


TOLSTOI, Liev

(1828-1910)


          Este genial escritor russo nasceu em 1828 em Iasnaia Poliana. Filho de uma importante família ligada aos Czares, ficou órfão ainda criança.
          Entrou na Universidade de Kazan onde estudou línguas orientais e direito. Em 1847, por herança tornou-se senhor de vastas terras em Iasnaia-Poliana.
          Depois de ter servido no exército, em 1856, viajou pela Europa visitando vários países, regressando então à sua terra natal para administrar suas terras e dedicar-se à literatura.
          Em 1861, voltou novamente a França para visitar seu irmão que se estava doente aproveitando para se encontrar com Proudhon. Com uma vida pessoal cheia de conflitos e uma personalidade dividida, Tolstoi aproximou-se, gradualmente, de uma posição pacifista e anarquista, recusando toda a forma de governo e poder.
          Na sua terra natal criou uma escola marcadamente libertária, próxima das experiências de Ferrer e da Escola Moderna, tendo pessoalmente escrito os livros usados na escola.
          Seus textos autobiográficos 
A Minha Confissão e Qual é Minha Fé foram apreendidos mas, mesmo assim, tiveram ampla difusão clandestina.
          Perseguido e excomungado pela Igreja, seus últimos anos são de engajamento social. Os escritos filosóficos influenciaram o aparecimento de comunidades e de uma corrente de anarquismo cristão, sobretudo em França, Holanda e EUA.
          Exerceu também, juntamente com Kropotkin e Thoreau, forte influência sobre um dos mais importantes pacifistas modernos: Gandhi, com quem chegou a manter correspondência. Faleceu em 1910.


KROPOTKIN, Piotr

(1842-1921)


          Escritor, filósofo e militante anarquista russo, nascido na nobreza russa em Moscou, em 1842.
          Depois de passar pelo Corpo de Pagens, já oficial, foi para a Sibéria onde realizou importantes levantamentos geográficos. Desligou-se do exército e tornou-se geógrafo, tendo percorrido a Sibéria e a Manchúria, onde pode conhecer de perto miséria dos povos sujeitos ao Czarismo.
          Em 1872, realizou uma viagem à Bélgica e à Suíça, onde entrou em contato com os anarquistas da 
Federação do Jura, tendo-se filiado na AIT.
          De volta à Rússia, começou uma militância em grupos clandestinos, o que o levaria aos cárceres czaristas. Depois de uma fuga espetacular, exilou-se no Ocidente, tendo retomado seus contatos com os anarquistas suíços, fundando e editando em Genebra, em 1879, o jornal 
Le Révolté, até ser novamente preso na França, em 1882.
          Libertado em 1885, depois de um amplo movimento de intelectuais e cientistas, entre os quais Herbert Spencer, Ernest Renan e Victor Hugo, refugiou-se na Inglaterra. Conviveu com os principais intelectuais da sua época e foi colaborador da 
Geographical Society. Em alguns de seus livros, Kropótkin tentou buscar uma base científica para o pensamento anarquista. E, se de sua pesquisa saíram trabalhos que ainda hoje desafiam o leitor, certamente incorreu também no erro de um racionalismo e otimismo científico típicos da sua época. Mas, foi certamente como propagandista revolucionário, que Kropótkin se tornou o mais traduzido e lido de todos os pensadores libertários.
          Seus livros faziam parte da biblioteca dos camponeses e operários em quase todos os países. 
Palavras de um Revoltado, Aos Jovens, Ética, O Estado e seu Papel na História tiveram edições em inúmeras línguas e em todos os continentes. O seu verbete sobre o anarquismo publicado na edição da Encyclopaedia Braitannica de 1910 é, até hoje, uma das mais bem elaboradas definições.
          Voltou à Rússia durante a Revolução de 1917. Crítico do autoritarismo comunista, escreveu a Lenin em março de 1920, denunciando a evolução autoritária que estava ocorrendo, divulgando, em junho, uma carta aberta aos trabalhadores do ocidente onde alertava para a evolução da Revolução Soviética. Em 21 de dezembro, voltou a fazer novas críticas em carta enviada ao dirigente comunista. Morreu em 8 de fevereiro de 1921. Seu funeral foi a última grande manifestação pública do anarquismo russo.
          Entre os seus principais livros estão 
A Conquista do Pão, Apoio Mútuo, Campos, Fábricas e Oficinas, Ética Anarquista e A Grande Revolução.


VASCO, Neno

(1878-1920)


          Advogado, jornalista e escritor anarquista, nascido em Portugal a 9 de maio de 1878. Seu nome era Gregório Nazianzeno Moreira de Queirós e Vasconcelos, mas ficaria conhecido por Neno Vasco.
          Fez parte do grupo de estudantes da Universidade de Coimbra que aderiram ao anarquismo no começo do século.
          Formado em direito, emigrou para o Brasil em 1901, para se juntar a seu pai. Em São Paulo logo entrou em contato com anarquistas como Benjamim Mota, Ricardo Gonçalves e os libertários italianos. Participou então da edição de 
O Amigo do Povo, que começou a circular em 1902. Algum tempo depois lançou a revista Aurora. Este movimento editorial haveria de contribuir para o crescimento da influência libertária nos meios operários. Nas páginas da Voz do Trabalhador travou uma polêmica sobre as relações entre anarquismo e sindicalismo, que é fundamental para entender a forma como os libertários se situaram face ao movimento operário e suas organizações.
          Em 1911, regressou a Portugal onde continuou a desenvolver sua militância anarquista, colaborando com a imprensa anarquista brasileira como correspondente. Na revista anarquista portuguesa 
A Sementeira escreveu sobre a situação social no Brasil.
          Neno Vasco, licenciado em direito, intelectual brilhante, um dos mais influentes militantes libertários de Portugal e do Brasil, morreu de tuberculose e pobre em 1920, no norte de Portugal.
          O seu principal livro é 
A Concepção Anarquista do Sindicalismo, publicado em 1923 pela editorial do jornal anarco-sindicalista A Batalha e re-editado em 1984.



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