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É mister dizer a respeito da criação do pacto, que Hobbes teme antes de mais nada o retorno do homem a seu estado de natureza, que é em linhas gerais um estado de barbárie, o que pode impedir essa entrega aos sentidos é o acordo de convivência entre pessoas que se diz contrato social. Todavia, em oposição ao que o senso comum tende a aceitar, a barbárie natural do homem sem governo não é essencialmente causada por um “mau” imanente ao gênero humano, mas por um extinto de auto-preservação que torna as pessoas inimigas de seu próximo na disputa de bens que favoreçam a continuação da vida. Dito isso, observa-se uma cisão clara de pensamento com alguns autores importantes da mesma escola dos contratos, como Jean Jacques Rousseau por exemplo, que conceitua a existência da virtude e da bondade como naturais ao homem por si só.
Para Rousseau, o estado de natureza é o momento mais excelso do sentido de humanidade presente em cada um. Em contrapartida, o Estado positivo, que hobbesianamente é a ferramenta de salvação do gênero humano, para o autor francês é mais um mau necessário, um recurso de segunda ordem que vem pra conter os ânimos após a degenerescência enfrentada sobretudo na criação da propriedade privada. Hobbes é desse modo, a antítese direta à Rousseau e a todo o secto de pensadores desenvolvidos à margem de suas idéias. Bem como apresenta toda uma ruptura com a tradição grega em geral e o legado aristotélico, já que aqui a comunidade política não é exatamente uma aspiração de felicidade que condiz com a natureza do gênero, mas antes um acontecimento impreterível para a conservação da espécie.
Isso, por entender como já dito, que só pode haver um sentido de equilíbrio social quando existe um poder geral e imperativo para regular e suprimir a tendência natural das gentes que seria a agressão mútua. Outro ponto que a filosofia hobbesiana trabalha com esmero é a idéia de unidade contra a anarquia, frisando que a possibilidade de uma discussão aberta acerca do justo e do injusto, do certo e do errado, é exatamente o que pode provocar a desagregação do poder, colapsando o seio social e tornando o homem a seu estado originário. Dessa forma, o aumento da liberdade individual rima com diminuição do poder do Estado, o que num desenrolar natural dos eventos traz anarquia e instabilidade às nações.
Essa cadeia de eventos tende a desaguar naquilo que é a expressão máxima do anarquismo, a guerra civil. Esse tipo de conflito é a morte do Estado, a perda total de uma referência do convívio harmônico entre homens. Assim, pode-se dizer que para Hobbes as possibilidades benéficas de refundação da comunidade política não são exatamente aceitas. Pois, tudo o que tem haver com ofensa à ordem estabelecida é elencado como reflexo da condição humana degenerada, não há uma alternativa à realização plena do homem senão em um corpo político organizado. Sua obsessão é construir um Estado de bases indissolutíveis que contrarie o “direito de natureza” em favor do “direito positivo” que seria estabelecido pela própria sociedade, tendo no Estado a figura de seu fiel sentinela.
Esse Estado de viés radicalmente absolutista tem sua descrição máxima na metáfora do Leviatã e sua urgência para o bem estar da comunidade política vem de dois pressupostos básicos. Os quais sejam, a vida humana. O homem enquanto um átomo de egoísmo deve amenizar sua tendência à agressão mútua trabalhando em sociedade. Também o conceito de convencionalismo, esse vai dizer que os homens estabelecem entre si regras para que se possa sobreviver em paz até alcançar o direito a uma morte natural e não violenta. Percebe-se aqui o leviatã como a encarnação de uma consciência que pretende-se onisciente e onipresente.
Assim colocado, há no ente humano a urgência de regulação por um Estado total, positivo e concentrado em todos os aspectos da vida em grupo. Dele vai derivar o que se pode dizer da idéia de uma ferramenta capaz de racionalizar o egoísmo dos homens que termina por ser também auto-destrutivo. Hobbes vai argüir a atribuição de uma legitimidade ao governante por meio de um consenso em que todos tenham conhecimento. Isso se deve pelo fato de que esse indivíduo representa o Estado para normatizar a vida em grupo de uma maneira irretratável, uma vez que da firmeza do julgo estatal depende a vida estável da comunidade política. Como especula no trecho a seguir:
“(...) até o momento em que se tome conhecimento de uma lei que as proíba; o que será impossível até o momento em que sejam feitas as leis, e nenhuma lei pode ser feita antes de se ter determinado qual a pessoa que deverá fazê-la. (...) Seja como for, é fácil conceber qual seria o gênero de vida quando não havia poder comum a recear, através do gênero de vida em que os homens anteriormente viveram sob um governo pacífico costumam deixar-se cair, numa guerra civil”. (Hobbes, Thomas. 1983, p. 110)
Nessa passagem fica clara tanto a necessidade de um ente específico para regular a vida social, bem como uma necessidade latente da violência regulamentada do Estado para com seus cidadãos. É dessa feita, pelo grau de habilidade em subtração das consciências individuais e alienação das vontades singulares que se pode medir o sucesso de um governo.
Em último é importante salientar que o governante, o cérebro do Leviatã, não governa em nome próprio. Ele é um representante no sentido mais largo do termo e como tal, vai tratar apenas de zelar pelo bem estar dos representados. Assim o governante é absoluto e tem poderes plenos, todavia, quando não cumpre sua função social que é a de fomentar uma justiça distributiva no sentido de garantir direitos e deveres comuns a todos, ele pode a qualquer momento enfrentar a deposição.
Em Hobbes a sociabilidade do homem é uma criação artificial inventada face ao medo da guerra e ao desejo de paz, isso faz com que ele conceba leis comuns, estabelecendo o pacto social que fundamenta o Estado. Nsse sentido, é possível imaginar que o autor tenha sido uma grande fonte de inspiração aos modelos de Estado totalitário e das ditaduras de direita que ocorreram no último século.
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