Em última instância deve-se concluir que Deus tal qual foi historicamente representado é além de um símbolo, fundamentalmente uma idéia. E assim como qualquer idéia produzida num mundo alicerçado em antagonismos, pode apresentar traços positivos ou negativos de acordo com sua utilização.
Por exemplo, o Deus de Israel que deu origem à tradição judaico-cristã do ocidente, conta-se que fez as tribos judias conquistarem muitas batalhas, e com sua fúria dizimou cidades inteiras como Sodoma, tudo em nome da dignidade, glória e exaltação do modo de vida judeu. Para esses, tais intervenções divinas foram um êxtase incomensurável mas, e para o povos conquistados?
O que pode haver de bom ou belo (atributos da divindade) no fato de ser massacrado em todas as formas imagináveis? Poderiam eles, as vítimas, encontrar nisso algo que os apetecesse?
Como sempre, é mister recordar que a história é escrita pelos vencedores, visto isso não pretendo me ater aqui à questão judaica isoladamente, busquemos então enfoques mais genéricos. À questão da divindade enquanto idéia, avancemos ao braço político de Deus, as religiões. Todas acreditam grosso modo num ser supremo, dotado de onipotência, onisciência, misericórdia, etc...
Entretanto a forma com que essa entidade dialoga com os homens varia radicalmente de uma seita (partido) para outra. Nesse sentido, em observância à oscilação conceitual, há que se especular que o fator Deus é antes mais uma projeção de dentro pra fora no homem que um dinamismo inalterado que rege o universo com equidade e temperança e assim nos atinge com seus infinitos raios de sapiência atemporal como tentam nos vender os pastores, padres, médiuns, beatos e quase toda a sorte de homens santos.
Ou a existência é um fenômeno geral ou particular à percepção de cada um, a primeira hipótese é levantada por todos os religiosos, mas no campo do pragmatismo estranhamente destoa de tudo quanto é pregado. Se houvesse uma generalidade palpável (unicidade do divino, coerência de suas ações...) poder-se-ia dizer que há uma força sábia em operação, todavia não há. Cada comunidade recebe a mensagem do divino de maneira diferente, isso gera etnocentrismo, arrogância e muitas vezes cenas da estupidez mais boçal.
Pense no dilema do selvagem que nasceu afastado de tudo, ou do hindu que mora na aldeia mais longínqua do norte da Índia, ambos sequer ouviram falar sobre o nome de Jesus. Segundo a bíblia, o livro que é a base da nossa civilização, só quem morre em cristo será salvo. Então a pergunta: pra que Deus criaria seres pra deixar sua alma entregue à danação desde o início? Não creio que isso seja algo exatamente compatível com a visão do divino, todavia isso é o que mostra um raciocínio frio acerca da questão. Mais tarde, os melhores teóricos e doutores da igreja hipotetizaram largamente no sentido de que a essas pessoas do exemplo acima poderiam contar com a bondade divina que os perdoaria pela ignorância. Meu amigo isso cheira mau.
Ignorância? Que condição eles tiveram de saber? Presos na miséria ou na abundância de suas realidades. Nesse exemplo nota-se além da incoerência do agir divino quando se põe a baila idéias como igualdade ao nascimento que estariam intimamente ligadas à igualdade de condições materiais, a incoerência dos seus intérpretes, esse teólogos que subvertem os códigos de acordo com a conveniência e muitas vezes a boa publicidade da instituição.
Assim o pensamento lógico é que se há um Deus, ele não elegeu ninguém, se o tivesse feito não haveriam tantas visões em conflito, pois, a força desse ser já teria operado mostrando sua vontade imperiosa. Deve-se concluir que, ou Deus brinca fazendo discursos demagógicos todos os quais nele acreditam, ou ele não diz nada e os homens criam as suas próprias visões, ou ele sequer existe. A primeira hipótese que é a do senso comum, às vezes me agride, a segunda e a terceira parecem mais dignas de análise. Contudo, voltando à questão inicial, em tese, o mesmo ser (já que praticamente todas as religiões afirmam a unidade de Deus) que manda um árabe explodir o próprio corpo pra matar americanos inocentes é o que manda americanos fartarem-se do sangue de árabes inocentes, e por aí vai. No fim tudo é política, hipocrisia e ressentimento. E como a genealogia do divino parte da imaginação frente a necessidade das circunstâncias, pode ser que o melhor Deus seja mesmo aquele que é mudo. Se é lícito criar Deuses, acho que é esse o meu modelo ideal.
2 comentários:
Muito bom o teu blog. Várias Referências excelentes. Vi alguns vídeos sobre Nietszche que, para um mero diletante em filosofia, foram muito proveitosos!
Fiquei lisonjeada pelo elogio ao meu blog, sobretudo, porque seus textos são de ótima qualidade. Voltarei outras vezes.
Saudações,
Janete.
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