domingo, 2 de maio de 2010

Agarrar a liberdade

O homem nasceu livre, e por todo o lado é escravo. Assim se julga o mestre de todos, que não deixa de ser mais escravo que eles. Como se deu esta mudança? Ignoro-o. O que a pode tornar legítima? Penso poder resolver essa questão.

Se não considerasse senão a força, e o efeito que tem, diria: enquanto um povo é constrangido a obedecer e obedece, faz bem; logo que pode sacudir o jugo, e o sacode, faz ainda melhor; porque amordaçando a sua liberdade com o mesmo direito com que esta o encanta, ou está destinado a readquiri-la, ou não podemos mais tirar-lha. Mas a ordem social é um direito sagrado que serve de base a todos os outros. No entanto esse direito não provém da natureza; é, portanto fundado em convenções. Trata-se de saber quais são essas convenções. Antes de voltar aqui, gostaria de esclarecer o que acabei de avançar.

A mais antiga sociedade e a única natural é a família. As crianças ficarão ligadas ao pai o tempo necessário para se conservarem. Logo que essa necessidade acaba, o laço natural dissolve-se. As crianças, isentas da obediência que devem ao pai, o pai isento dos cuidados que deve aos filhos, ambos retomam igualmente a independência. Se continuam a ficar unidos não é naturalmente, é voluntariamente, e a família, ela-mesma não se mantém senão por convenção.

Esta liberdade comum é uma consequência da natureza do homem. A sua primeira lei é velar pela sua própria conservação, os seus primeiros cuidados, são aqueles que deve a si-mesmo, e, desde que na idade da razão, só ele é juiz dos meios adequados à sua conservação e torna-se por isso o seu próprio mestre.
*Jean-Jacques Rousseau

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