sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

É encargo da arte criar uma realidade paralela?

Que, para o artista, o talento máximo seja imitar a realidade até se confundir com ela é, no entanto, um lugar comum do juízo estético que, mesmo entre nós até a época recente, prevaleceu durante muito tempo. Para glorificarem os seus pintores, os gregos reuniam pequenas histórias: uvas pintadas que os pássaros vinham debicar, imagens de cavalos que os seus congêneres pensavam estar vivos, cortina pintada que um rival pedia ao autor que levantasse para poder contemplar o quadro dissimulado por detrás. A lenda atribui a Giotto e a Rembrant este mesmo tipo de proeza. Sobre os seus pintores famosos, a China e o Japão contam histórias muito semelhantes: cavalos pintados que, à noite, deixam o quadro para irem pastar, dragão partindo a voar pelos ares quando o artista acrescenta o último pormenor que faltava.

Quando os índios das pradarias da América do Norte viram, pela primeira vez, um pintor branco a trabalhar, ficaram confusos. Catlin tinha retratado um deles de perfil; um outro índio que não simpatizava com o modelo, gritou que o quadro provava que aquele era apenas uma metade de homem. Seguiu-se uma desordem mortal.

É a imitação do real que Diderot começa por admirar em Chardin: "Este vaso é de porcelana, estas azeitonas ficam de fato separadas do olhar pela água em que nadam (...) estes biscoitos é só agarrá-los e comê-los."

(...)

A sabedoria das nações atesta que Pascal levanta um verdadeiro problema ao exclamar: "Que vaidade a da pintura, que suscita a admiração pela semelhança com coisas cujos originais não são admirados." O romantismo para quem a Arte não imita a Natureza mas, exprime o que o artista põe de si próprio nos quadros, não escapa ao problema; o mesmo acontecendo à crítica contemporânea que faz do quadro um sistema de signos. Pois o trompe - l'oil¹ exerceu, e continua a exercer, o seu império sobre a pintura. Refaz o visível quando pensamos que ela se libertou definitivamente dele.
*Claude Lévi - Strauss
**1 Trompe-l'oeil é uma técnica artística que, com truques de perspectiva, cria uma ilusão óptica que mostre objetos ou formas que não existem realmente. Provém de uma expressão em língua francesa que significa engana o olho e é usada principalmente em pintura ou arquitetura.

Um comentário:

Monica disse...
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