O devir exerce sua função de princípio enquanto é. Isto significa que o devir remete a algo, que é aquilo pelo qual (= princípio) o devir desenvolve a sua função unificadora: em última análise, não é o devir que é princípio, mas aquilo pelo qual o devir é. O princípio é, portanto, o ser, ou seja, o princípio é aquilo que se apresenta com a universalíssima determinação pela qual não é nada, mas é ser. Captar, entretanto, o ser como princípio comporta uma série de implicações.
a) Só o ser pode exercer a função de princípio, pois não é possível ir além do ser. Enquanto todos os outros princípios permanecem ultrapassáveis, ou seja, a respeito deles se pode, e se deve, fazer uma pergunta ulterior, um por que ulterior, ultrapassar o ser significa cair no nada, quer dizer, no não-ser, que não é. É neste sentido que o ser possui uma primariedade absoluta.
b) O ser não pode ser outra coisa senão ser. Rigorosamente pensando, ou seja, atendo-nos ao puro plano do ser, o outro diferente do ser é essencialmente o nada, quer dizer, voltando ao que já foi dito, o não-ser, que não é.
c) O ser, não podendo ser outra coisa senão ser, não pode devir, isto é, não pode nem ser gerado (pois toda geração implica que o ser derive do não-ser) nem se corromper ou perecer (já que toda corrupção implica que o ser desemboque no não-ser); ele é, pois, imperecível e eterno.
d) Sendo esta a essência do ser, o seu logos, a sua lei, a sua lógica é o princípio de não-contradição, que decreta a sua impossibilidade de não-ser, a sua infinita oposição ao não-ser: o ser é e não pode não ser; o não-ser não é e não pode ser (= é impossível que seja). Parmênides, o fundador da metafísica, é o pai da incontraditoriedade do ser.
e) Conseqüentemente, por força do princípio de não-contradição, o ser na sua totalidade é necessidade de ser e permanência no ser.
Se, porém, o ser é o princípio, é preciso estabelecer como ele se põe em relação com todas as coisas na multiplicidade e no devir destas mesmas coisas.
Relativamente à multiplicidade, todo outro diferente do ser deve ser negado: a planta é outro diferente do ser, e assim por diante. Toda diferença, diversidade, variedade, enquanto outro diferente do ser, decai na negação, porque decai na anulação do ser, ou seja, no não-ser: afirmar a multiplicidade das coisas equivale a afirmar que o não-ser é. Se, portanto, o não-ser não pode ser e se a multiplicidade é necessariamente, pelo menos no plano do rigor lógico e lingüístico, não ser, é forçoso negar a multiplicidade: ela não passa de opinião, ilusão.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao devir. Porque também o devir, quer seja interpretado como alteração do ser – o devir outro, que dá origem à multiplicidade -, quer seja entendido como passagem do não-ser ao ser e do ser ao não-ser, inclui em si a realidade do não-ser: ele põe a contradição do ser que não é e do não-ser que é. E também esta contradição é resolvida, superada, mediante a negação do devir: não passa de opinião, ilusão.
E uma vez que a multiplicidade e o devir no seu conjunto constituem o mundo, a negação deles significa a negação do mundo. A verdade é a unidade e a imobilidade do ser; o mundo multíplice e em situação de devir não é a verdade, mas mera aparência, opinião, ilusão: à verdade do ser contradiz a verdade do mundo, e a contradição é eliminada afirmando que o mundo é somente ilusão.
Mas o que significa negar o mundo? Significa negar o aparecer da multiplicidade e do devir, a sua manifestação, a sua presença: esta negação é a negação da experiência; com esta negação nega-se a verdade da experiência; negando o mundo se nega que a experiência seja verdade; ela é relegada para a não-verdade. A verdade consiste somente na afirmação do ser: esta afirmação é sancionada pelo logos, pela lógica do ser, isto é, pelo princípio de não-contradição. É este princípio, pois, que cava uma intransponível contradição entre o logos, a razão de um lado, e a experiência do outro, entre o ser e o mundo, entre o ser como princípio e todas as coisas das quais deve ser o princípio. É esta contradição que constitui o formidável problema deixado por Parmênides como herança para a filosofia posterior.
Para fornecer, porém, os traços mais precisos desta contradição, devemos examinar mais a fundo os elementos do problema. Por um lado se impõe o logos (a lógica, o pensamento, a razão), que é a evidência da necessidade e imutabilidade do ser, a sua inegabilidade: o logos é a verdade do ser enquanto é a manifestação deste mesmo ser, a sua logicidade incontestável. Mas, por outro lado, a experiência é a manifestação do mundo multíplice e em situação de devir, atestação inegável do aparecer do mundo; e também esta manifestação é, é ser; não é nada; não se dá, com efeito, aparição do não-ser. Se, então, a experiência é ser, ela não pode apresentar-se senão com a própria inegabilidade que o ser mostra no logos: isto significa que a experiência é verdade e, por conseguinte, também o mundo, que constitui o conteúdo da experiência – aquilo que na experiência se mostra -, é verdade, e verdade necessária e irrefutável.
O resultado é que nos encontramos diante de duas evidências inegáveis: a da verdade do logos e do ser e a da verdade da experiência e do mundo. É impossível negar uma ou outra destas verdades, sacrificar uma delas à outra: semelhante negação seria contradição, ou seja, equivaleria a dizer que o ser não é.
Ora, se Parmênides nega a verdade da experiência e do mundo, ele cai em contradição, cria uma contradição; e uma contradição tanto mais gritante porque nasceria do princípio de não-contradição, cuja descoberta constitui a sua grandeza. Vale dizer, para negar a verdade do mundo Parmênides recorre, na realidade, ao princípio de não-contradição, que proíbe a negação daquilo que inegavelmente se demonstra ser; em resumo: ele negaria o princípio de não-contradição usando o próprio princípio de não-contradição. Além disso, a negação da verdade do mundo é a negação de todas as coisas. Ficaria salvo somente o ser, mas não como princípio, pois neste caso não dá origem a nada; o ser seria princípio somente de si mesmo e de nenhuma outra coisa. Mas um princípio, que é princípio de nada, não é princípio. Trata-se, no caso, de mais uma contradição.
A esta altura se propõe ineludivelmente a pergunta: visto que, se nega o mundo, cai em duas contradições tão flagrantes, é concebível que Parmênides não se tenha apercebido disso? Quer dizer, é historicamente cabível atribuir a Parmênides uma negação deste tipo? Parece que devemos responder de maneira negativa. E conseguimos a prova disso analisando os seus textos, dos quais apresentamos três exemplos:
a) “É necessário, portanto, que conheças tudo, (a) tanto o coração imóvel da rotunda Verdade, (b) quanto as opiniões dos mortais nas quais não se encontra certeza veraz. Além disso, saberás também isso: como é necessário (c) que as coisas que aparecem sejam indubitavelmente, precisamente porque elas são todas do todo” (Fr 1, VV. 28-32).
b) “Observa por meio da intuição (inteligência) como as coisas longínquas (ausentes) estão sólidas e igualmente próximas (presentes); com efeito, não separarás o ser do seu contato com o ser, tanto na fase em que se produz a dispersão total, como na fase em que ele se recolhe” (Fr 4).
c) “Tudo está repleto de ser” (Fr 8, v. 24), que deve ser confrontado com: “Tudo está repleto igualmente de luz-noite” (Fr 9, v. 3). O contexto do Fr 8 é este: “Não existe de um lado um mais nem de outro um menos que o mantenham afastado da conexão: com efeito está repleto de ser; por isso tudo é conexo, porque o ser adere ao ser” (VV. 23-25). O contexto do Fr 9 é o seguinte: “… uma e outra (são) (qualitativamente) iguais, uma vez que o nada não participa de nenhuma das duas”.
O que se pode concluir a partir destes textos é o seguinte: o ser é, e é ser, e não pode não ser; portanto, não existe senão ser; o ser enche completamente tudo com a sua compacidade, que não admite cisões, separações, desconexões no seu interior; tudo enchendo completamente, o ser constitui a verdade de tudo, e tudo aquilo que é, é indubitavelmente manifestação do ser; não existe manifestação do não-ser, pois o não-ser não é e não pode passar a fazer parte de nenhuma coisa. Ora, as coisas se manifestam como multíplices e em situação de devir; é precisamente porque se manifestam que as coisas são, não só no sentido que são, mas também no sentido de o que são, isto é, na sua alteridade: o ser as constitui na sua verdade porque é a lógica intrínseca destas mesmas coisas que domina completamente a sua diversidade; ou seja, porque é a filigrana íntima, que lhes confere a sua validade; a presença igualmente sólida do ser é a verdade das coisas, as quais, conseqüentemente, não são verdadeiras apenas pelo fato que são inegavelmente e, portanto, se opõem infinitamente ao não-ser delas, mas são verdadeiras também naquilo que diz respeito ao seu ser desta ou daquela forma (árvore, animal etc.) sendo este seu ser desta ou daquela forma – ser isto ou aquilo – é inegavelmente inegável e se opõe infinitamente ao seu não-ser desta ou daquela forma, não ser isto ou aquilo.
A opinião, que não é certeza veraz, consiste em considerar as coisas prescindindo – portanto, realizando uma cisão, uma separação, uma desconexão – do seu ser, ou seja, eliminando a sua lógica intrínseca, a sua filigrana autenticadora. Deste modo, separadas do ser (e é nesta separação que se dá efetivamente uma cisão do ser = aquilo pelo qual as coisas são e se manifestam, a partir do ser = o próprio consistir e o próprio manifestar-se das coisas; em resumo: a experiência do multíplice e do devir), as coisas não são e não são sequer deste ou daquele modo, isto ou aquilo: aparentemente são, mas realmente não são. Neste caso a multiplicidade e o devir não passam de ilusão, aparência, opinião, quando não são consideradas no seu ser, ou seja, na sua verdade. Percebe-se, assim, em que sentido se deve entender a afirmação dos dois caminhos: o do dia, da verdade e do ser; o da noite, do erro e do não-ser. Conclusão: Parmênides não nega as coisas, achando que não passam de ilusões e aparência, mas nega que as coisas sejam ilusão e aparência: só o erro é que pode considerá-las tais.
*Aniceto Molinaro
a) Só o ser pode exercer a função de princípio, pois não é possível ir além do ser. Enquanto todos os outros princípios permanecem ultrapassáveis, ou seja, a respeito deles se pode, e se deve, fazer uma pergunta ulterior, um por que ulterior, ultrapassar o ser significa cair no nada, quer dizer, no não-ser, que não é. É neste sentido que o ser possui uma primariedade absoluta.
b) O ser não pode ser outra coisa senão ser. Rigorosamente pensando, ou seja, atendo-nos ao puro plano do ser, o outro diferente do ser é essencialmente o nada, quer dizer, voltando ao que já foi dito, o não-ser, que não é.
c) O ser, não podendo ser outra coisa senão ser, não pode devir, isto é, não pode nem ser gerado (pois toda geração implica que o ser derive do não-ser) nem se corromper ou perecer (já que toda corrupção implica que o ser desemboque no não-ser); ele é, pois, imperecível e eterno.
d) Sendo esta a essência do ser, o seu logos, a sua lei, a sua lógica é o princípio de não-contradição, que decreta a sua impossibilidade de não-ser, a sua infinita oposição ao não-ser: o ser é e não pode não ser; o não-ser não é e não pode ser (= é impossível que seja). Parmênides, o fundador da metafísica, é o pai da incontraditoriedade do ser.
e) Conseqüentemente, por força do princípio de não-contradição, o ser na sua totalidade é necessidade de ser e permanência no ser.
Se, porém, o ser é o princípio, é preciso estabelecer como ele se põe em relação com todas as coisas na multiplicidade e no devir destas mesmas coisas.
Relativamente à multiplicidade, todo outro diferente do ser deve ser negado: a planta é outro diferente do ser, e assim por diante. Toda diferença, diversidade, variedade, enquanto outro diferente do ser, decai na negação, porque decai na anulação do ser, ou seja, no não-ser: afirmar a multiplicidade das coisas equivale a afirmar que o não-ser é. Se, portanto, o não-ser não pode ser e se a multiplicidade é necessariamente, pelo menos no plano do rigor lógico e lingüístico, não ser, é forçoso negar a multiplicidade: ela não passa de opinião, ilusão.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao devir. Porque também o devir, quer seja interpretado como alteração do ser – o devir outro, que dá origem à multiplicidade -, quer seja entendido como passagem do não-ser ao ser e do ser ao não-ser, inclui em si a realidade do não-ser: ele põe a contradição do ser que não é e do não-ser que é. E também esta contradição é resolvida, superada, mediante a negação do devir: não passa de opinião, ilusão.
E uma vez que a multiplicidade e o devir no seu conjunto constituem o mundo, a negação deles significa a negação do mundo. A verdade é a unidade e a imobilidade do ser; o mundo multíplice e em situação de devir não é a verdade, mas mera aparência, opinião, ilusão: à verdade do ser contradiz a verdade do mundo, e a contradição é eliminada afirmando que o mundo é somente ilusão.
Mas o que significa negar o mundo? Significa negar o aparecer da multiplicidade e do devir, a sua manifestação, a sua presença: esta negação é a negação da experiência; com esta negação nega-se a verdade da experiência; negando o mundo se nega que a experiência seja verdade; ela é relegada para a não-verdade. A verdade consiste somente na afirmação do ser: esta afirmação é sancionada pelo logos, pela lógica do ser, isto é, pelo princípio de não-contradição. É este princípio, pois, que cava uma intransponível contradição entre o logos, a razão de um lado, e a experiência do outro, entre o ser e o mundo, entre o ser como princípio e todas as coisas das quais deve ser o princípio. É esta contradição que constitui o formidável problema deixado por Parmênides como herança para a filosofia posterior.
Para fornecer, porém, os traços mais precisos desta contradição, devemos examinar mais a fundo os elementos do problema. Por um lado se impõe o logos (a lógica, o pensamento, a razão), que é a evidência da necessidade e imutabilidade do ser, a sua inegabilidade: o logos é a verdade do ser enquanto é a manifestação deste mesmo ser, a sua logicidade incontestável. Mas, por outro lado, a experiência é a manifestação do mundo multíplice e em situação de devir, atestação inegável do aparecer do mundo; e também esta manifestação é, é ser; não é nada; não se dá, com efeito, aparição do não-ser. Se, então, a experiência é ser, ela não pode apresentar-se senão com a própria inegabilidade que o ser mostra no logos: isto significa que a experiência é verdade e, por conseguinte, também o mundo, que constitui o conteúdo da experiência – aquilo que na experiência se mostra -, é verdade, e verdade necessária e irrefutável.
O resultado é que nos encontramos diante de duas evidências inegáveis: a da verdade do logos e do ser e a da verdade da experiência e do mundo. É impossível negar uma ou outra destas verdades, sacrificar uma delas à outra: semelhante negação seria contradição, ou seja, equivaleria a dizer que o ser não é.
Ora, se Parmênides nega a verdade da experiência e do mundo, ele cai em contradição, cria uma contradição; e uma contradição tanto mais gritante porque nasceria do princípio de não-contradição, cuja descoberta constitui a sua grandeza. Vale dizer, para negar a verdade do mundo Parmênides recorre, na realidade, ao princípio de não-contradição, que proíbe a negação daquilo que inegavelmente se demonstra ser; em resumo: ele negaria o princípio de não-contradição usando o próprio princípio de não-contradição. Além disso, a negação da verdade do mundo é a negação de todas as coisas. Ficaria salvo somente o ser, mas não como princípio, pois neste caso não dá origem a nada; o ser seria princípio somente de si mesmo e de nenhuma outra coisa. Mas um princípio, que é princípio de nada, não é princípio. Trata-se, no caso, de mais uma contradição.
A esta altura se propõe ineludivelmente a pergunta: visto que, se nega o mundo, cai em duas contradições tão flagrantes, é concebível que Parmênides não se tenha apercebido disso? Quer dizer, é historicamente cabível atribuir a Parmênides uma negação deste tipo? Parece que devemos responder de maneira negativa. E conseguimos a prova disso analisando os seus textos, dos quais apresentamos três exemplos:
a) “É necessário, portanto, que conheças tudo, (a) tanto o coração imóvel da rotunda Verdade, (b) quanto as opiniões dos mortais nas quais não se encontra certeza veraz. Além disso, saberás também isso: como é necessário (c) que as coisas que aparecem sejam indubitavelmente, precisamente porque elas são todas do todo” (Fr 1, VV. 28-32).
b) “Observa por meio da intuição (inteligência) como as coisas longínquas (ausentes) estão sólidas e igualmente próximas (presentes); com efeito, não separarás o ser do seu contato com o ser, tanto na fase em que se produz a dispersão total, como na fase em que ele se recolhe” (Fr 4).
c) “Tudo está repleto de ser” (Fr 8, v. 24), que deve ser confrontado com: “Tudo está repleto igualmente de luz-noite” (Fr 9, v. 3). O contexto do Fr 8 é este: “Não existe de um lado um mais nem de outro um menos que o mantenham afastado da conexão: com efeito está repleto de ser; por isso tudo é conexo, porque o ser adere ao ser” (VV. 23-25). O contexto do Fr 9 é o seguinte: “… uma e outra (são) (qualitativamente) iguais, uma vez que o nada não participa de nenhuma das duas”.
O que se pode concluir a partir destes textos é o seguinte: o ser é, e é ser, e não pode não ser; portanto, não existe senão ser; o ser enche completamente tudo com a sua compacidade, que não admite cisões, separações, desconexões no seu interior; tudo enchendo completamente, o ser constitui a verdade de tudo, e tudo aquilo que é, é indubitavelmente manifestação do ser; não existe manifestação do não-ser, pois o não-ser não é e não pode passar a fazer parte de nenhuma coisa. Ora, as coisas se manifestam como multíplices e em situação de devir; é precisamente porque se manifestam que as coisas são, não só no sentido que são, mas também no sentido de o que são, isto é, na sua alteridade: o ser as constitui na sua verdade porque é a lógica intrínseca destas mesmas coisas que domina completamente a sua diversidade; ou seja, porque é a filigrana íntima, que lhes confere a sua validade; a presença igualmente sólida do ser é a verdade das coisas, as quais, conseqüentemente, não são verdadeiras apenas pelo fato que são inegavelmente e, portanto, se opõem infinitamente ao não-ser delas, mas são verdadeiras também naquilo que diz respeito ao seu ser desta ou daquela forma (árvore, animal etc.) sendo este seu ser desta ou daquela forma – ser isto ou aquilo – é inegavelmente inegável e se opõe infinitamente ao seu não-ser desta ou daquela forma, não ser isto ou aquilo.
A opinião, que não é certeza veraz, consiste em considerar as coisas prescindindo – portanto, realizando uma cisão, uma separação, uma desconexão – do seu ser, ou seja, eliminando a sua lógica intrínseca, a sua filigrana autenticadora. Deste modo, separadas do ser (e é nesta separação que se dá efetivamente uma cisão do ser = aquilo pelo qual as coisas são e se manifestam, a partir do ser = o próprio consistir e o próprio manifestar-se das coisas; em resumo: a experiência do multíplice e do devir), as coisas não são e não são sequer deste ou daquele modo, isto ou aquilo: aparentemente são, mas realmente não são. Neste caso a multiplicidade e o devir não passam de ilusão, aparência, opinião, quando não são consideradas no seu ser, ou seja, na sua verdade. Percebe-se, assim, em que sentido se deve entender a afirmação dos dois caminhos: o do dia, da verdade e do ser; o da noite, do erro e do não-ser. Conclusão: Parmênides não nega as coisas, achando que não passam de ilusões e aparência, mas nega que as coisas sejam ilusão e aparência: só o erro é que pode considerá-las tais.
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