sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Viagem ao continente

Estranho que todos queiram começar um relato com frases de efeito, confetes não resumem a mesma substância de uma confissão espontânea. Maquiar a tragédia tem haver com qualquer pedido de perdão que reste irrealizável. Dos imateriais auto-falantes nos vem notícias de terra incivilizada, escrever ou pintar é uma tentativa surda de extirpar um tumor usando as mãos. Não pode funcionar, a incisão necessita frieza cirúrgica. E num lugar em que ninguém pode aspirar ser, eu sou o ártico de todo sul tranqüilo, a norte de qualquer alma que merece uma segunda chance.

Nada é como deveria ser, perdeste o melhor amigo, algumas carnes feitas de teu corpo feneceram diante de teus olhos... Tome um café, ou desmaie de letargia enquanto pensa. No final o que conta é poder perceber o humor das coisas simples, pode-se engavetar o que passou e recomeçar por entre girassóis. Pra outra vez se perder e se achar, e se consumir, e experimentar-se a si mesmo durante a queda em tantos descaminhos quanto forem as estrelas do céu. Isso tudo faz lembrar um teatro em decadência, do tipo com cortinas que teimam em se prender quando puxadas para o entre-ato. A ferrugem contida nas articulações de um mecanismo possui encanto singular, todavia se não demovê-la, acaba fazendo do espetáculo algo monótono.

Cada dor merece um relicário adornado, tu bem o sabes. Entre a fronteira cinza de alucinação e potência, as cores surgem como pássaros por aqui. Como passar pela nau do Caronte e permanecer a si mesmo, e ser gente em labores titânicos. Ademais, toda flor é digna de ser colhida, não fosse a aspereza de alguns espinhos, talvez a seda das pétalas permaneceria oculta. O tempo assim como as estórias são uma forma de falsear o que se sente, velhice é coisa de quem aprendeu a se guiar pela cegueira que vem de fora.

Mais um pouco e tudo já terá se esvaído, um segundo, e tudo bastará ao eterno. Há uma tempestade oculta em cada aspiração que a alma consente, como desejar fosse liberar um trovão indômito. Tudo é quando se quer, nada pode quando se esquece. Até as ilhas mais longínquas flertam com o continente quando a maré esta calma. Abra bem os olhos, depois feche-os quando convir. A partir desse ponto o que virá é inevitável. Deixe de rastejar e reformule seu par de asas.
*Leandro M. de Oliveira
**À Monica com gravidade

Um comentário:

Monica disse...

Amigo Leandro!

Sou seguidora! esta fazendo um
ano.Um ano que mergulho aqui.
Hoje,agora,na Viagem ao Continente
depois de ter passado pela nau do
Caronte e espinhos da indiferença
entrei na gravidade da situação.

Mas como você bem diz(sempre)vou
reformulando meu par de asas...
Afinal tem a gravitação, lei essa
que faz a terra o sol e outros
corpos celestiais existirem...
Agradeço a amizade!

O Soturna,sempre me deixa Primavera

Um abraço,
Monica.