quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Justificativa da ação

Saber a razão primária por que alguém agiu como agiu é saber a intenção com que a ação foi feita. Se viro à esquerda numa bifurcação porque quero chegar a Katmandu, a minha intenção, ao virar à esquerda, é chegar a Katmandu. Mas saber a intenção não consiste, necessariamente, em conhecer a razão primária com todo o pormenor. Se James vai à igreja com a intenção de agradar à sua mãe, deverá ter alguma pró-atitude face a agradar à sua mãe, mas é necessária mais informação para que se possa dizer se a sua razão é a de gostar de agradar à sua mãe, se é pensar que isso é o correto, se é um dever ou se é uma obrigação.

[...]

Quando perguntamos a alguém por que agiu como agiu, queremos obter uma interpretação. Talvez o seu comportamento pareça estranho, alienígena, ultrajante, injustificado, mal interpretado, desconexo. Ou talvez nem consigamos mesmo reconhecer uma ação nesse comportamento. Quando compreendermos a sua razão teremos uma interpretação, uma nova descrição do que fez e que encaixará num quadro habitual. Esse quadro inclui algumas das crenças e atitudes do agente. Talvez também inclua metas, fins, princípios, traços gerais de caráter, virtudes ou vícios. Para além disto, a redescrição de uma ação proporcionada por uma razão pode situá-la num contexto de avaliação — social, econômico, linguístico — mais alargado. Compreender, mediante a compreensão da razão, que o agente concebeu a sua ação como uma mentira, o pagamento de uma dívida, um insulto, o cumprimento de uma obrigação avuncular ou um jogo de xadrez, significa apreender o desígnio da ação enquanto aplicação de regras, práticas, convenções e expectativas.

Comentários como estes, inspirados no segundo Wittgenstein, têm sido elaborados com sutileza e profundidade por um considerável número de filósofos. E não há maneira de negar que são verdadeiros: quando explicamos uma ação através da respectiva razão, redescrevêmo-la. Redescrever a ação dá à ação um lugar num certo padrão e, por este caminho, explica-se a ação.

*Donald Davidson

Um comentário:

De acordo com disse...

A-d-o-r-e-i!
Vc já está linkado no meu blog,
na sessão 'mistão'.
Abraço!