quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Desoras

I

Levei-te a minha casa mas nenhum
de nós dois foi capaz de me encontrar
tu por ser já talvez um pouco tarde
eu pelos anacronismos do costume

Por isso amada se apesar de tudo
nem sempre fomos só iguais a nada
teremos de arranjar novo teatro
onde a verdade logre melhor lume

mais capaz de a si próprio se tornar
esse instante de cada instante único
em que o instante ou só passa ou a passagem
mais que só consumir-se nos consuma

pois nem o tempo pode outro lugar
que não nos falte ou exceda onde nos une




II

Que sabes tu do inferno de onde estou
a telefonar-te agora? Mas também
como haverias tu de o saber se nem
eu sei já onde estou nem bem quem sou?

Porquê tentar de resto que o soubesses
em vez de te falar dessa promessa
nisso mostrando já melhor cabeça
que seria qualquer sítio onde estivesses

por acaso e eu chegasse por acaso
e depois sucedesse que em me vendo
quisesses cavalgar o tanto atraso
de quanto até então eu fora sendo?

E o rio cuja agonia ao fundo estancas
singraria as tuas mãos nas minhas ancas

*Miguel Serras Pereira

2 comentários:

Van disse...

Amo vir aqui e poder sorver um pouco do néctar dessas poesias tão densas. São como a Alma.

Convido-te a visitar meu recanto de singelos textos quando tiveres vontade de alguma poesia também : www.universidadedesentidos.blogspot.com

Grande Beijo, te sigo sempre !

Van disse...

Honra minha ver você passeando pelo meu quintal...admirando meus escritos tão despretensiosos !

Fiz para celebrar a vida com um pouco de poesia e sigo assim !

É sempre bem vindo por lá, vá quando quiser e deixe suas impressões.

Impossível vc dizer que aqui em seu espaço não há propósito. Há tanta vida aqui na sua poesia ! Tudo tão intenso e forte como a própria vida...Grande Beijo e adorei mesmo a visita !