sábado, 30 de agosto de 2008

Em Resposta ao Último e-mail Recebido

Certa vez Câmara Cascudo assim escreveu sobre o seu ofício, fazendo um paralelo entre o incessante (e muitas vezes criticado) labor do homem de letras e o trabalho infindável e inútil das Danaides, com maestria ele supõe a profissão de fé que é a escrita. Espero que isso lhe baste, ácido amigo...



As Danaides eram cinqüenta filhas de Danao, rei de Argos. Seu irmão, Egito, tinha cinqüenta filhos. Mandou a filharada masculina casar com as primas. Danao não queria o casamento. Combinou com as filhas um plano.

Os cinqüenta recém-casados tiveram a mais estranha noite de núpcias de que há notícias no mundo.

Foram todos assassinados pelas esposas. Só escapou um, Linceu, poupado por sua mulher, Hipernestra.

Júpiter condenou as Danaides às penas do Tártaro, que era o inferno daquele tempo.

As Danaides enchiam um tonel sem fundo. Séculos e séculos, sem pausa, sem descanso, sem interrupção, as moças carregaram água, despejando-a no barril furado.

Teodoro de Banville contou o fim dessas Danaides, na Lanterna Mágica.

Os Titãs venceram os Deuses. O Tártaro ficou sem chefe, despovoado de sofredores, todos perdoados.

Astério anuncia a terminação da sentença:
- Acabou vosso suplício. Largai essa penitência. O tonel está cheio.
As Danaides pararam, pela primeira vez, há milênios. Enxugaram a fronte, descendo as bilhas infatigáveis. E dizem confusas e desapontadas:
- Está cheio o tonel? Pois bem! Que havemos de fazer?
Já estavam habituadas com o trabalho contínuo, mesmo inútil.

Não perguntem, pois, amigos, por que escrevo sempre, com ou sem leitores, com ou sem compreensão, estímulo ou tolerância.

Deixem-me com o meu barril sem fundo. A tarefa finda significaria o repouso incômodo, a displicência, a preguiça mortal.

Por isso, mesmo sem ter ofendido Apolo, encho, obstinado e tranqüilo, a talha imperfeita, escondido num recanto de província.

Quando não mais ouvirem o rumor da água agitada, não se dirá que Júpiter sucumbiu.

Será que, para sempre, desfaleceu na Morte, o braço humilde do trabalhador...

Luís da Câmara Cascudo
A República, 25 de setembro de 1943

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Poema Seguido de Conjeturas



RITORNO

Da questa lontananza
io parlo.

Parlo cieli parlo uomini
che cacciano l'inizio.

Non ritornerò
da questa colma distanza.

Ho la consistenza del silenzio
primigenio.
Quindi aspetto la fioritura degli arrivi.

Sono partita per sempre,
assieme alle storie
dimentiche di tutti gli inverni.

RETORNO

Dessas distâncias
eu falo.

Digo céus digo homens
que caçam a origem.

Não voltarei
dessa plena distância.

Tenho a consistência do silêncio
primeiro.
Pois espero a floração das chegadas.

Parti para sempre,
com as histórias
órfãs de todos os invernos.

(Prisca Agustoni)

Um pequeno porém muito simbólico texto de Prisca Agustoni, uma jovem escritora suíço-italiana de obra multilíngüe. Pra mim particularmente, esse poema tem o cheiro de um lugar do passado que tão perfeito era, soa hoje como imaterial, como uma dessas fábulas que se cria pra existência ter uma justificação menos miserável do que a cotidiana; mas os tributos cobrados pela vida são irremediáveis, e como sempre, o caminho do encontro é a despedida. O que é em verdade o estado passional senão o afã de momentaneamente reaver os dons que são
por nós descartados com essas vidas de mentira... Eu não sei...
... o importante é que no final, o outro deve mesmo ser apenas uma meta, uma projeção que nasce de uma carência aguda de si mesmo. Ele não existe em verdade.
Se partiu, é porque nunca pertenceu a esse lugar.
Mas o ser humano é deveras um animal viciado pela auto-piedade e sempre busca reciclar o seu lixo por um preço muito maior do que realmente vale.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Ensaios de Friedrich Nietzsche 1ª Parte

Moral como Antinatureza (Parte 1)

I
Todas paixões têm uma fase em que são meramente desastrosas, em que aviltam sua vítima com o peso
da estupidez – e uma fase posterior, muito posterior, em que se casam com o espírito, se
“espiritualizam”. Antigamente, em vista da estupidez na paixão, declarava-se guerra à própria paixão,
conspirava-se pela sua destruição; todos os velhos monstros da moral concordavam quanto a isto: il faut
tuer les passions [1]. A fórmula mais famosa para isso encontra-se no Novo Testamento, naquele Sermão
da Montanha, onde, diga-se de passagem, as coisas não foram de modo algum olhadas do alto. Nele é
dito, por exemplo, particularmente em relação à sexualidade: “Se teu olho te escandaliza, arranca-o
fora”. Felizmente nenhum cristão age de acordo com esse preceito. Destruir as paixões e os desejos,
simplesmente como uma medida preventiva contra a estupidez e as conseqüências desagradáveis dessa
estupidez – hoje isso se apresenta a nós apenas como outra forma aguda de estupidez. Não admiramos
mais os dentistas que arrancam dentes para que não doam mais. Para ser justo, deve-se admitir,
entretanto, que sobre o solo no qual o cristianismo se desenvolveu, o conceito de “espiritualização da
paixão” nunca poderia formar-se. Afinal, a Igreja primitiva, como todos sabem, lutou contra os
“inteligentes” em favor dos “pobres de espírito”. Como se poderia esperar dela uma guerra inteligente
contra a paixão? A Igreja combate a paixão através do aniquilamento em todos os sentidos: sua prática,
sua “cura” é a castração. Ela nunca pergunta: “como se pode espiritualizar, embelezar, divinizar um
desejo?” Em todos os tempos colocou a ênfase da disciplina na extirpação (da sensualidade, do orgulho,
do desejo de dominar, da avareza, da vingança). Mas um ataque às raízes da paixão significa um ataque
às raízes da vida: a prática da Igreja é hostil à vida.
[1] É necessário matar as paixões.

II
Os mesmos meios na luta contra um desejo – castração, extirpação – são instintivamente escolhidos por
aqueles que possuem uma vontade fraca demais, degenerada demais, para poderem impor a moderação
a si mesmos; por aqueles que necessitam de La Trappe, para falar figuradamente, ou (sem figuras de
linguagem) alguma espécie de declaração definitiva de hostilidade, um abismo entre eles e a paixão.
Meios radicais são indispensáveis apenas para os degenerados; a fraqueza da vontade – ou, falando de
modo mais preciso, a incapacidade de não responder a um estímulo – é em si apenas outra forma de
degeneração. A hostilidade radical, a hostilidade mortal contra a sensualidade é sempre um sintoma
merecedor de reflexão: ela nos permite fazer suposições concernentes ao estado geral de quem é
excessivo desta maneira.
Essa hostilidade, esse ódio, a propósito, alcança seu clímax apenas quando esses tipos carecem mesmo
da firmeza suficiente para a cura radical, para a renúncia a seu “Diabo”. Deveria-se examinar toda a
história dos sacerdotes e dos filósofos, incluindo a dos artistas: as coisas mais venenosas aos sentidos
foram ditas não pelos impotentes, nem pelos ascetas, mas pelos ascetas impossíveis, por aqueles que
realmente tinham uma necessidade enorme de ser ascetas.

III
A espiritualização da sensualidade é chamada amor: representa um grande triunfo sobre o cristianismo.
Outro triunfo é a nossa espiritualização da hostilidade. Ela consiste num profundo reconhecimento do
valor de se ter inimigos: em suma, significa agir e pensar de modo oposto ao que outrora era a regra. A
Igreja sempre desejou a destruição de seus inimigos; nós, imoralistas e anticristãos, encontramos nossa
vantagem nisto: que a Igreja existe. No âmbito da política a hostilidade também se tornou mais
espiritualizada – muito mais sensível, muito mais pensativa, muito mais ponderada. Quase todo partido
compreende que é de interesse à sua própria autopreservação que seus opositores não percam toda a
força; o mesmo vale para políticos poderosos. Uma nova criação em particular – um novo Reich, por
exemplo – necessita mais de inimigos que de amigos: somente na oposição ele sente-se necessário,
somente na oposição ele torna-se necessário. Nossa atitude perante o “inimigo interior” não é de modo
algum diferente: aqui também espiritualizamos a hostilidade; também aqui reconhecemos seu valor. O
preço da fecundidade é ser rico em oposições internas; permanece-se jovem enquanto a alma não relaxa
e anseia pela paz. Nada nos parece mais estranho que aquele desejo dos tempos antigos, o desejo
cristão: a “paz da alma”; nada nos causa menos inveja que a vaca moral e a felicidade gorda da boa
consciência. Renuncia-se à vida grandiosa quando se renuncia à guerra.
Em muitos casos, certamente, a “paz da alma” é apenas um mal-entendido – algo diverso, para o qual
falta um nome mais honesto. Sem mais rodeios ou preconceitos, vejamos alguns exemplos. A “paz da
alma” pode ser, para alguém, a suave irradiação de uma rica animalidade no interior da esfera moral (ou
religiosa). Ou o começo do cansaço, a primeira sombra da noite, qualquer espécie de noite. Ou o sinal de
que o ar está úmido, de que os ventos do sul se aproximam. Ou uma inconsciente gratidão por uma boa
digestão (por vezes chamada “amor aos homens”). Ou a obtenção da calma por um convalescente que
sente um novo sabor em todas as coisas, e aguarda. Ou o estado que se segue de uma completa
satisfação de nossa paixão dominante, o bem-estar de uma rara repleção. Ou a fraqueza senil de nossa
vontade, de nossos desejos, de nossos vícios. Ou a preguiça, persuadida pela vaidade a exibir uma
aparência moral. Ou o aparecimento da certeza, mesmo da certeza terrível, após uma longa tensão e
sofrimento causados pela incerteza. Ou a expressão da maturidade e maestria em meio ao agir, criar,
trabalhar e desejar – respirar tranqüilo, a “liberdade da vontade” alcançada. Crepúsculo dos Ídolos –
quem sabe? Talvez também apenas um tipo de “paz da alma”.

Bom Pessoal, acho que o cara que fez esse texto despreza apresentações, é o meu filósofo preferido, as suas lições sobre a necessidade de libertação do senso comum na busca pelo estado de Übermensch (super homem), sempre me afiguraram como um farol na noite escura... E hoje nesses tempos de descrença em que nos entregamos a verdades pré-fabricads, aparece novamente Nietzche, como uma sentinela velando pela libertação de cada um. A transcendência desse estado de torpor contínuo em que vivemos (sociedade) parece uma jornada dura, parece uma busca solitário, mas é a vida, se cada um não toma posse integral da sua termina como escravo retido sob os piores grilhões, que são aqueles que não se pode ver, e você se deita na confortável cama ou dirige seu novo carro, projeta uma imagem de sucesso para os que passam, mas naquela escura fenda por entre as rochas onde ninguém ousa descer existe uma insatisfação latente, que vem e sufoca com um toque silencioso, sem se explicar. E você se vê finalmente preso, sitiado pela artificialidade de suas próprias construções, a solução, faça como Nietzche deixe de ser apenas homem, seja dinamite¹ pura e exploda toda a hipocrisia que tão cuidadosamente você e as pessoas a seu redor tem alimentado. Nas próximas postagens virá a segunda parte do ensaio acima assim como novos textos, a todos boa leitura.

1 - "Conheço a minha sina. Um dia, meu nome será ligado à lembrança de algo tremendo - de uma crise como jamais houve sobre a Terra, da mais profunda colisão de consciência, de uma decisão conjurada contra tudo o que até então foi acreditado, santificado, querido. Eu não sou um homem, sou dinamite." (Nietzsche - Ecce Homo)

Neruda deixa a gente nostálgico como o diabo ...

Farewell

Desde el fondo de ti, y arrodillado,
un niño triste como yo, nos mira.

Por esa vida que arderá en sus venas
tendrían que amarrarse nuestras vidas.

Por esas manos, hijas de tus manos,
tendrían que matar las manos mías.

Por sus ojos abiertos en la tierra
veré en los tuyos lágrimas un día.

Yo no lo quiero, Amada.

Para que nada nos amarre
que no nos una nada.

Ni la palabra que aromó tu boca,
ni lo que no dijeron tus palabras.

Ni la fiesta de amor que no tuvimos,
ni tus sollozos junto a la ventana.

Amo el amor de los marineros
que besan y se van.

Dejan una promesa.
No vuelven nunca más.

En cada puerto una mujer espera:
los marineros besan y se van.

(Una noche se acuestan con la muerte
en el lecho del mar.)

Amo el amor que se reparte
en besos, lecho y pan.

Amor que puede ser eterno
y puede ser fugaz.

Amor que quiere libertarse
para volver a amar.

Amor divinizado que se acerca
Amor divinizado que se va.

Ya no se encantarán mis ojos en tus ojos,
ya no se endulzará junto a ti mi dolor.

Pero hacia donde vaya llevaré tu mirada
y hacia donde camines llevarás mi dolor.

Fui tuyo, fuiste mía. ¿Qué más? Juntos hicimos
un recodo en la ruta donde el amor pasó.

Fui tuyo, fuiste mía. Tú serás del que te ame,
del que corte en tu huerto lo que he sembrado yo.

Yo me voy. Estoy triste: pero siempre estoy triste.
Vengo desde tus brazos. No sé hacia dónde voy.

...Desde tu corazón me dice adiós un niño.
Y yo le digo adiós.

(P. Neruda)

Sobre sonhos e pscanálise

A teoria dos sonhos, assim como a própria técnica da psicanálise, progrediu lentamente, porém, logo que Freud completou a sua concepção, passou a considerá-la como um dos pontos principais da teoria psicanalítica. Não é de admirar que Freud tomasse essa atitude, pois, assim como o conceito de recalque realça a atividade do inconsciente, a teoria dos sonhos indica os caminhos indiretos que este toma para se expressar. Nos sonhos, as forças reprimidas são vistas burlando as resistências por caminhos tortuosos e a todo custo obtendo satisfações proibidas.

De acordo com Freud, o sonho é essencialmente uma satisfação disfarçada dos desejos que foram recalcados durante o estado de vigília. Os sonhos são muito mais significativos e muito mais complexos do que parecem. Cada sonho possui um conteúdo manifesto e outro latente. O conteúdo manifesto é a descrição que se faz ao relembrar o sonho - o sonho em sua aparência; porém, o conteúdo latente possui o seu significado verdadeiro. O conteúdo manifesto pode ser fornecido pelos acontecimentos do estado de vigília de cada um - de fato, e é comumente extraído das experiências das vinte e quatro horas anteriores; mas, apesar de tudo isso, o sonho não é um simples e casual jogo de associações triviais.

O conteúdo manifesto é simples material empregado pelas forças psíquicas reprimidas. Os desejos que foram lançados no inconsciente durante o dia têm oportunidade de se exprimir à noite, quando o sono enfraquece a vigilância do "censor", figura de retórica usada por Freud para denominar as inibições que o ego impõe ao inconsciente. Mas, mesmo quando o ego dorme e a censura é diminuída, os desejos afastados não ousam se expressar abertamente. Se fossem francamente sexuais, a pessoa que dorme acordaria chocada; realmente, quando o significado de um sonho se torna muito evidente, a pessoa desperta. Portanto, os desejos proibidos utilizam disfarces e se esgueiram pelo censor até a consciência, sem serem reconhecidos.

Os disfarces são vários e engenhosos ao extremo. Um deles é o simbolismo. As pessoas, objetos e fatos que aparecem no conteúdo manifesto do sonho realmente significam alguma outra coisa. A festa pública da qual uma paciente participou em seu sonho representava o enterro de seu marido. A fuga aterrorizada de um inimigo comumente representa a busca há muito desejada de um amante. Alguns símbolos extraem o seu significado de experiências pessoais íntimas de quem sonha; outros são comuns a toda a humanidade e têm sempre o mesmo significado. Jardins, sacadas e portas significam o corpo feminino, e as flechas de campanários, velas e serpentes, os órgãos sexuais masculinos.

Entretanto, o simbolismo não realiza sozinho o trabalho do sonho; há outras maneiras de encobrir o verdadeiro significado do sonho. Parece não haver limites para a engenhosidade do inconsciente em seus artifícios para iludir o censor. Um item importante pode ser disfarçado a fim de parecer uma parte trivial do todo e, contudo, ser realmente o principal motivo para o sonho. Ou a emoção importante pode ser associada a um objeto de aparência neutra. E, mesmo depois que o sonho foi completamente disfarçado, o trabalho do mesmo não está completo. Quando quem sonha desperta, não deve saber o quê, de fato, esteve fazendo. Então, se dá uma segunda elaboração. Ao recordar e relatar o seu sonho, a pessoa que sonha inconscientemente coloca-o em forma lógica e coerente, de maneira a possuir alguma semelhança com uma história ou fato real. Porém, no próprio sonho, a lógica e a coerência não estão presentes nem se sente a sua falta, pois sonhar é a expressão de uma forma profunda e primitiva de pensar, na qual maneiras lógicas e críticas do pensamento não foram ainda implantadas. Assim, os sonhos revelam não só a linha tortuosa do inconsciente, mas também o caráter alógico de suas funções.

Ps: Ainda para a menina que me confiou os seus segredos (Sobre a Pergunta que não queria calar) ...

Amor condusse noi ad una morte

Quando o olhar, adivinhando a vida,
prende-se a outro olhar de criatura,
o espaço se converte na moldura,
o tempo incide incerto sem medida,


as mãos que se procuram ficam presas,
os dedos estreitados lembram garras
da ave de rapina, quando agarra
a carne de outras aves indefesas,

a pele encontra a pele e se arrepia,
oprime o peito o peito que estremece,
o rosto o outro rosto desafia,

a carne entrando a carne se consome,
suspira o corpo todo e desfalece
e triste volta a si com sede e fome.

(Paulo Mendes Campos)

Uma abordagem acerca da angústia humana à luz de Kierkegaard (Para a menina triste)

De maneira geral, pode se dizer que na vida há três caminhos ou sendas que o indivíduo acaba escolhendo de maneira mais ou menos espontânea, de acordo com predileções particulares de cada qual, dentro dessas há uma série de subdivisões que serão descobertas a partir do sujeito em si. As três grandes vertentes são : A Estética, a ética, e a religiosa.
A primeira diz respeito ao homem comprometido com o prazer da vida, com o gozo de cada momento, é a caricatura tradicional do assim chamado irresponsável, do playboy; Já a vida no sentido ético, vem nos falar do tradicional pai de família, de um ser humano maquinalmente comprometido com as suas “obrigações”, trabalho, crença na sociedade etc; A última concepção de agir, a ação religiosa, vem inevitavelmente de encontro ao sentimento de impotência do homem ante a vastidão do mundo, o indivíduo religioso é alguém essencialmente desacreditado, ele busca uma realidade sobrenatural, tentando conceber a origem e o motivo das coisas.
A grande questão, entretanto, não é ter conhecimento dos comportamentos, mas sim ter ciência do ponto de partida para a ocorrência desses estereótipos. É necessário entender, a priori de qualquer reflexão, que o homem antes de ser envolvido em todo o arcabouço de valores sociais, tradicionais ou não, é ele um ser livre por excelência. E uma vez que se defronta com a realidade (artificial) do senso comum, ele (o homem) se sente acuado, nessa condição de pasmo com o próprio “eu”, se vê entregue. Hora pela falta de auto-crença, hora pela crença exacerbada em verdades alheias o ser se coloca em uma sub-condição de não governo e cria fugas diversas, pela projeção de uma imagem de potência (ideal estético), pela projeção de uma imagem de retidão (ideal ético) ou pela justificação de si numa sofismática transcendente (ideal religioso), mas por mais escravo que esteja, por mais esquecido de si,no coração do homem, no recanto mais sombrio, existe um vulcão latente (a essência de cada um) que se não se permitir caminho para a vazão de sua lava quando chega a erupção ela apenas o seu próprio produtor.
Homem se vê posto na linha de tiro entre o ser e o dever, a razão e o desejo, o teatro e a vida... É mister lembrar que só se vive uma vez e a vida é curta demais ! Vença-se a si mesmo e depois disso não haverão mais adversários. Um velho mestre disse uma vez: “O HOMEM É UM DEUS ENFAIXADO !” Retirem-se as Faixas e busque-se a verdade de cada um.

Ps: Dedicado a você que me confiou os seus segredos...

Prólogo (ou Uma Apresentação Clichê)


Eu sou o Tenebroso, o Irmão sem irmão,
o Abandono, Inconsolado,
o Sol negro
da melancolia

Eu sou Ninguém, a Calma sem alma
que assola, atordoa e vem
No desmaio do final de
cada dia...

...Eu sou a Bala que voa pra sempre, sem rumo,
perdida

Eu sou a Explosão, o Exu, o Anjo, o Rei
Eu sou o Morro, o Soberano, a Alegoria
que foi a minha vida

Eu sou a Execução, a Perfuração
O Terror da próxima edição dos jornais
Que me gritam, me devassam e me silenciam.
(El Desdichado II - Lobão)