Nada mudou.
O corpo faz doer,
tem que comer, que respirar e que dormir,
tem a pele fina e o sangue logo em baixo,
provisão farta de dentes e de unhas,
ossos que quebram, articulações que esticam.
Nas torturas tudo isto é tido em conta.
Nada mudou.
O corpo treme como tremeu
antes e após a fundação de Roma,
no século XX antes de Cristo e depois,
torturas há, como antes houve,
apenas a terra diminuiu,
e o que quer que se passe é como se passasse ali à esquina.
Nada mudou.
Há só mais gente.
às velhas culpas novas se juntaram,
reais, insinuadas, fugazes e nenhumas,
mas o grito com que o corpo lhes responde,
é, foi e será um grito de inocência,
numa escala e num registo eternos.
Nada mudou.
talvez só as maneiras, a dança, as cerimónias.
O gesto da mão protegendo a cabeça
permanece o mesmo todavia.
O corpo enrosca-se, arranha-se e arranca-se,
cai das pernas cortadas, encolhe os joelhos,
arroxeia, incha, baba-se e sangra.
Nada mudou.
Fora o curso do rio,
a linha das florestas, da costa, desertos e glaciares.
Entre paisagens assim se desfia a alma,
desaparece e volta, aproxima-se e parte,
estranha para si própria, inabarcável,
certa uma vez e logo incerta de existir,
enquanto o corpo está, está e está
e não tem lugar para onde ir.
*Wislawa Szymborska
quarta-feira, 31 de agosto de 2011
terça-feira, 9 de agosto de 2011
Será tudo mentira?
Será tudo mentira?
Desde quando?
Encurraladas as verdades de outrora
que eram apenas desejos…
E os desejos crescem como as plantas
seguindo as estações…
E o desejo tornou-se uma voz desolada.
Também te dói, dizes.
Bem sei.
Se posso?
Três dias sim, três dias não…
Os dias também perderam as estações.
Desejo poder.
*Sofia Leal
Desde quando?
Encurraladas as verdades de outrora
que eram apenas desejos…
E os desejos crescem como as plantas
seguindo as estações…
E o desejo tornou-se uma voz desolada.
Também te dói, dizes.
Bem sei.
Se posso?
Três dias sim, três dias não…
Os dias também perderam as estações.
Desejo poder.
*Sofia Leal
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